Wednesday, August 29, 2007

sobre o aborto

"naquele dia, o seu filho nasceu para dentro.
e quanto mais o tempo passava, mais o menino crescia:
esbarrando no seu coração"

Rita Apoena
hoje acordei na grécia, com uma amiga que recebeu um presente grego mas decidiu não abrí-lo nessa hora.

Monday, August 20, 2007

engraçado...
pensei numa coisa e ela aconteceu.
agora tenho medo de pensar porque nem sempre penso em coisas boas.

hoje ainda acordei sentindo o estranhamento que dormiu comigo ontem.
será que se eu sentir também acontece?
tomara que não.

Friday, July 13, 2007

modelito novo

"eu estou vestida com as roupas e as armas de jorge
para que meus inimigos tenham pés e não me alcancem
para que meus inimigos tenham mãos e não me peguem, não me toquem
para que meus inimigos tenham olhos e não me vejam
e nem mesmo um pensamento eles possam ter para me fazerem mal"


pois eu estou vestida com as roupas e as armas de jorge, e isso basta pra encarar a festa.

o que escuto agora



silêncio pra ouvir os sons de fora.
pra perceber a voz de quem me fala
pra entender a sonfonia do barulho que vem de lá


silêncio pra calar a boca.
pra acalmar o sentimento
pra aliviar o peso do corpo


silêncio pra gritar bem alto.
pra ensurdecer o medo
pra ecoar a dor


silêncio pra pensar com calma.
pra convencer a razão
pra enlouquecer o que ainda é são


silêncio pra sair correndo.
pra perder de vista
pra esquecer de tudo


eu preciso de silêncio pra começar tudo outra vez.
só que não como outrota. agora, em silêncio.

Thursday, June 28, 2007

"fotografar é uma forma de resistir e existir"

paula sampaio.

"...trabalhe numa coisa que você ame porque não se pode esperar cinco dias para aproveitar apenas os dois do final de semana."

mário testino, fotógrafo, claro!

Wednesday, June 27, 2007

o dia em que o mundo trocou as pernas.



e ela não quer mais passar batom nem ficar no tom. tá cansada de correr pra chegar no horário e sorrir um bom dia pra quem não o quer. a roupa suja se acumula no canto do quarto enquanto o corpo perambula pelado de rumo. já não pensa mais no futuro porque diz que é coisa de quem não tem o que fazer e pisoteou todos os sonhos porque acha que tudo o que é de graça não presta.

jogou o vaso de flores fora e deixou o pobre do peixe beta sem comida por uma semana. desconta seu descontentamento em quem não fala e fala que não vai mais pagar conta. já não pinta as unhas e muito menos coloca aquela flor de plástico no cabelo. parece que quer ficar feia pra provar que a beleza não põe mesa. mesa? eh! a mesma que ela não quer mais olhar para porque tem um computador mais inteligente que ela. parou de ir à feira e comprar tomate fresco da horta da d. jamir e agora prefere comer hamburguer de minhoca no mc donald´s.

desligou o telefone pra não ser achada e a televisão pra fingir que não vê as balas perdidas. não vai mais ao cinema e inventa problema, já não brinca com a molecada e vive mal humorada, deixou de ler romace porque agora acha bobagem esse lance, não come algodão doce e perdeu a rima.

desistiu do verde e comprou o cinza. dividiu em poucas vezes, porque ela sabe bem que amanhã é outro dia, quem sabe até de ganhar na loteria uma dose maior de alegria.



ilustração de caio ducca.

Thursday, May 31, 2007


Não tem meio termo.
Termo e meio a gente ta em discussão
E não tem trégua nem pausa pra um refresco
Ta maluco?
Ta?
Então ta.
Agora a poesia só vai dizer e nada de rima nem de aderir a gênero literário ou de vanguarda plástica ou resgate de música trovadoresca de não sei que canto do planeta.
Agora é tudo um troço só.
Só sucata lingüística que a gente monta e remonta que nem um quebra-cabeça
Quebra-cabeça que não tem resposta não.
Refazendo poema
Refazendo
Encontrando poesia nos es nos ex nos is nozes nocivos nos noivos nos ex noivos nos noves fora nonos nos nãos nos nuncas nos nos
Encontrando poesia sila ba após si laba após si la ba.
Mesmo que a poesia não esteja escrita assim assim com palavrinhas
Preto no branco
Escreveu não leu
Não ta alfabetizado
E estamo conversado?
Não estamos realmente realmados e armados com alguma poesia pra conseguir ver a poesia que passa a pé por aí. Que grita nos olhos ardidos de olhar daquela menina. Que acena das mãos velhas das velhas que respeitamos. Que chora na boca faminta dos moleques que ainda não tiveram força nem um tempinho entre um choro e outro pra sonhar em ser ronaldinho.
Mesmo que a poesia não esteja escrita assim assim, com palavrinhas e tudo
Ta lá.
E lá
É lindo.

flávio louzas, um moço que tem poesia. e que é lindo.

Wednesday, May 30, 2007

é nisso que eu creio também.

“Acho que só devemos ler a espécie de livros que nos ferem e trespassam. Se o livro que estamos lendo não nos acorda com uma pancada na cabeça, por que o estamos lendo? Porque nos faz felizes, como você escreve? Bom Deus, seríamos felizes precisamente se não tivéssemos livros e a espécie de livros que nos torna felizes é a espécie de livros que escreveríamos se a isso fôssemos obrigados. Mas nós precisamos de livros que nos afetam como um desastre, que nos magoam profundamente, como a morte de alguém a quem amávamos mais do que a nós mesmos, como ser banido para uma floresta longe de todos. Um livro tem que ser como um machado para quebrar o mar de gelo que há dentro de nós. É nisso que eu creio.”
Franz Kafka, carta a Oscar Pollak, 1904

Wednesday, May 23, 2007

e ele me escreveu assim:



"estarei sempre aqui para transformar seus dias londrinos em lindos céus de Monet".


e eu quis que Monet estivesse vivo pra pintar a grandeza do que senti.

abre e fecha, aqui e acolá.

por um momento achei que minhas gavetas haviam se fechado.
bobagem pura e cristalina, uma vez abertas, pra sempre cheias.
acho que porque descobri outras maneiras de preenchê-las, ou outras formas de atirar palavras no vento. sei lá. percebi que posso abrir a boca e cuspir imagens, que consigo fechar os olhos e ver poesia, que gosto de sentir e colocar pra fora fotografias. sei como eu cheguei até isso não, mas percebo que é onde me perco, encontro e equilibro.
pra variar, a brincadeira da vez é o pique-esconde e a única brincante sou eu. me escondo do que, de quem, onde, como e por que. e sempre me encontro agaixada na canto esquerdo daquela fotografia, respirando baixo pra ninguém ouvir e com cara de quem espera o previsível. boba eu, que me escondo do que eu mesma procuro ver, e morro de gargalhar.
nem sei se falar é mais fácil com palavra, com gesto, com imagem, com pintura, com olho, com silêncio incômodo. nem sei direito o que é falar, no sentido mais difícil que tu consegue imaginar.
mas eu acho fácil sentir, sabe? mesmo que seja escuro, que traga medo. é mais fácil porque é teu, tá dentro das tuas gavetas e, parafraseando algo que era o máximo da falta de educação e prepotência infantil: "a gaveta é minha e eu abro ou fecho quando eu quiser!!!"
então eu decidi que quero abrir outra vez, porque tenho sentido tanto...
o que eu vou colocar lá dentro, todo mundo já sabe, só devaneios! (paciência! a metade de mim que não é água é devaneio!). agora... como, eu também já descobri da última vez que brinquei de pique-esconde, quando me encontrei sozinha, no meio do nada, com uma câmera fotográfica na mão, em silêncio. eu percebi que a gente pode sentir, falar e calar prum mundo inteiro de uma só vez, com um só aperto no disparador.
e eu tenho falado ou calado coisas mais ou menos assim:

Tuesday, January 16, 2007

sobre desenhar com luz, sobre falar com silêncio.

"A luz é o sal alucinatório que, queimando, irradia as visões: e o que vive sobre a película, vive pela luz"

frase de Tazio Secchiaroli e foto de Jack Delano

Thursday, November 23, 2006

meu devaneio me enganou. conto de fada, e que fada!

não era nada disso, ele só tinha esquecido o caminho da minha casa.
se perdeu na marginal pinheiros, sabe?
e eu aqui, me perdendo em mil devaneios ....
ufa!

Thursday, November 16, 2006

conto de fada, que nada.

o cavalo dele machucou a pata e teve que ficar de repouso. o caminho é longo pra vir a pé e não tem graça chegar sem o bichano branco.


o despertador da vida não tocou, ou ele dormiu profundo, sonhou demais e acabou não ouvindo o "pim pim pim" do relógio.

a rainha mãe sofre de síndrome de abandono e não deixa o filhinho sair debaixo da asa dela. então não permite que ele saia de casa, por medo de ir "comprar cigarro" e nunca mais voltar.

estava com dor de barriga, comeu muito brigadeiro na festinha da criadagem e ficou indisposto.

o castelo está em reforma e é ele quem comanda a obra, não pode se ausentar e deixar tudo nas mãos dos servos que, de arquitetura real nada entendem.

choveu muito por aquelas bandas e a estrada ficou cheia de barro. nem as mais possantes carruagens conseguiram sucesso, quem dirá um rélis cavalinho branco.

ele tentou ligar mas, o celular não só pega no alto da colina, e quando pega.

eu esperei.
eu inventei.
eu imaginei.
eu sonhei
eu me enganei.
nada disso aconteceu.
ele não veio montado em seu cavalo branco.
ele não tem cavalo branco.
ele não existe.


eu apenas devaneei.

"o tanto de tudo que eu tô pra te dar..."

adoro isso, é lenine.

Monday, November 06, 2006

coisinhas do coração da menina.


tem frio na barriga?tem, digamos... borboletas no estômago!
e a mão, sua frio? vixe! parece que tá até chorando...
dá vontade de ficar no pertinho dele? todo dia, toda hora, a vida toda.
fica imaginando como seria acordar ao lado desse moço? fico, imagino até o dia em que não mais dormiremos pelo choro da criançada pela casa.
e as pernas ficam bambinhas quando tu vê? parece que vão cair as duas, ou é o chão que me falta?
a respiração muda? demais. como se tivesse corrido meia cidade em ritmo frenético.
dá vontade de que? ai... nem sei... acho que de parar o tempo e congelar as pessoas.
até ele? não, ele não. é só pra reduzir 36 bilhões em 2. eh... um mundo feito em 2 e sem relógio.
e a cabeça pensa o que, hein? pensa nada, acho que quando o coração bate a razão tira férias.
os sentidos se alteram? nó... e muito! a visão é concentrada em um ponto só. o olfato cheira aquela flor, dama da noite. o paladar fica seco e imagina o gosto que já é conhecido. a audição só atende ao barulho de dentro e ao silêncio de olho cruzado. e o tato...ah o tato! fica ali, a espera de sensações, inquieto e carinhoso.
enfim... e o coração? esse fica como criança esperando pela hora de subir no balanço. e sonha, e cria, e espera, e acelera, e palpita, e ri, e agoniza, e bate, bate, bate, bate.... acende luzes vermelhas, faz silêncio no mundo, abre as cortinas e anuncia: "acomode-se, menina, o filme já vai começar!"

Thursday, October 26, 2006

quinta-feira, rindo.

06.40, o despertador contou pra ela.
puxa o braço, levanta a perna, estica a coluna, respira, expira e inspira um bom dia.
pasta de dente arde a língua e ela ri.
água gelada, toalha quente de sol, corpo leve de sonho em cor, olho aberto pra quinta-feira.
tênis. bermuda verde. camiseta sem manga e sem compromisso.
mochila nas costas, maçã na boca, vento no rosto, música alta pra cantar a manhã.
e vai aula e vem almoço.
vem computador, telefone e escrtitório. vai livro, conversa fiada, capuccino, fim do expediente.
chega o azul escuro e o claro se vai.
foge o calor que não quer ficar sem o sol.
tá frio e ela de bermuda verde.
lá vem a sexta e se vai a quinta.
indo, rindo, vindo, rindo, saindo, rindo, chegando, rindo, correndo, rindo, andando, andando, andando, andando.
pra chegar. onde? disseram pra ela que é pra alcançar a felicidade.

que nada, ela bem sabe que a felicidade é só mais um lugar feliz.
e, por isso, rindo. sempre.

Sunday, October 08, 2006

responde pra mim?

eu só queria saber se o mundo seria mais fácil se a gente soubesse ser mais verdadeiro.
só queria poder perder o pudor da palavra e ganhar a clareza do sentimento puro e direto.
por que a gente não vive o tanto que devaneia?
tem que mudar.
eu vou.

Friday, October 06, 2006

eu, o jão e o seu pé de feijão.


o jão tem um pé de feijão.
pra chegar lá em cima e ver a vida como e com ele, tem que subir um monte.
eu não tenho medo de altutra.
mas tenho vontade de chegar no pé de feijão e ficar no pertinho do jão.
ainda tô no começo da subida, ainda mais perto da terra do que do topo do pé de feijão, e do jão.
mas eu sou senhora do tempo, a gente se entende e se respeita bem.
além do que, lá em cima do pé de feijão não tem ponteiro, nem o jão tem relógio.
e eu sigo sem hora pra chegar, agora me preocupo mais em saber o caminho que vai me levar pro jão e seu pé de fejão.
há de ser muito divertido, ver o mundo de cima do pé de feijão e dividir ele com o jão...
e haja fantasia nesse meu coração!

a menininha do desenho é de Jen Corace.

Wednesday, October 04, 2006

acuntição, isso mesmo, acuntição.

"Que nada, menina! Eu gosto é de viver "as acuntição" mesmo. É muito mais fácil assim, olha pra tu ver: toda vez que eu tô indo prum lado da cidade, eu recebo um telefonema que me leva pra outro. Eu tenho muitos clientes na madrugada, sabe? A Dona Carmem, por exemplo, me lilga toda hora pra levar os travestis que ela comanda pra casa depois do serviço. Aí eu levo, porque é gente também e paga sempre em dia. Mas o mais legal é que, vez ou outra, eu acabo virando a esquerda e beirando manhã nos bares com eles. É a acuntição, tá vendo? Essa gente não sabe viver não, ninguém ainda descobriu que a vida é feita de acuntição. As coisas querem acontecer e tu tem que deixar, ora bolas! Eu que não sou bobo já descobri, quem não tem acuntição, vive bem não, viu menina?"



conversa fiada com seu Zé da "acuntição",
taxista paranaense que me levou pra casa dia desses.

troca de roupa.


há tempos não venho aqui derramar palavras nas minhas gavetas.
eu te conto o motivo. parece que o mundo deu uma cambalhota e eu ainda não consegui virar a cabeça pra cima outra vez. tudo novo. ou o velho de roupa nova? sei não.
a cor parda virou fluorescente.
do alto, eu já consigo chegar perto.
o linear virou labirinto gostoso demais de se perder.
tarde agora é cedo e muito é quase nada.
o de dentro vive querendo sair e ganhar ouvido de gente.
acho que agora começo a entender bem sobre o mundo adulto. e ele já não me assusta tanto.
será que o inevitável aconteceu?
resposta melhor é sentir as coisas chegando e se aquietando em mim.
sem que eu perceba, vou trocando de casulo e, quando vejo, já tenho tudo muito dentro.
é como dormir no seu quarto e acordar em uma casa na árvore, entende?
pelo visto alguma coisa permaneceu, o essencial: a convicção plena de que viver a vida adulta dentro de um parque de diversões é muito mais gostoso!

Tuesday, August 08, 2006

A imagem pura provoca uma emoção mais espontânea do que aquela que resulta de uma exposição cuidadosamente estruturada, dirigida à compreensão, pois a mensagem que ela transmite é imediatamente percebida e não sofre a interferência de explicações "sábias".

Pierre Verger, 1993.

Saturday, August 05, 2006

.............................................

É uma das coisas que eu mais gosto de fazer. É desenhar a vida na frente do espelho.
Fica tudo mais gostoso, claro, do jeito que você quer. Tudo perfeito, sem nenhuma dobrinha amarrotada.
Mas, no fundo, esses desenhos quase que alucinações sãs, ficam em forma de portas a serem abertas.
Devaneios podem ser levados a sério, não em amplitude, mas em doses homeopáticas.
Eu levo. Eu caso, mudo de país, ganho na loteria, tenho uma filha chamada Joana e um moleque Luan, passo férias na ilhas do Mediterrâneo, aprendo a fotografar o mundo dos outros, envelheço na praia e viro algodão doce quando a vida me faltar.
Talvez eu possa 10% de tudo isso, que não é nem a primeira página do meu caderno de desenhos. E vale muito esse pouco, porque eu teimo em acreditar que devaneios são momentos de sanidade plena vestidos de carnaval.
Então, que venham os bailes, as máscaras, o pierrô, a serpentina, a marchinha e o meu bloco inteiro.
Porque eu vou passar, sem dor, carregando meu caderninho cheio de desenhos feitos pra uma vida que quer ser mais que um desenho na frente do espelho.

Tuesday, July 11, 2006

Na hora de perder a hora





O tempo anda correndo de mim.
Acho que é porque as idéias andam voando na minha cabeça.
Parece que as horas de olho aberto são poucas.
Mas, como diz o Duda, é bom também.
É ótimo, sentir que o tempo, mesmo que fora da minha hora, ainda é meu amigo.




foto de josef koudelka, mais um dos que eu quero ser igual quando crescer!
sem pressa...

Sunday, July 02, 2006

Silêncio

As palavras andam sumidas.
Talvez escondidas.
Talvez oprimidas.
Talvez dormindo.
Talvez mordidas.
Talvez com frio.
Talvez descansando.
Talvez pensativas.
Talvez sofrendo.
Talvez cantando.
Talvez fugindo.
Talvez perdidas.
Talvez doídas.
Talvez brincando.
Talvez cuspidas.
Talvez meio azedas.
Talvez mal quistas.
Talvez engasgadas.
Talvez inventadas.
Ou nada disso.
Palavras também podem ser mudas, é só fechar a boca e ouvir.

Tuesday, June 20, 2006

Na maré

Tinha prancha pra surfar.
Lá tinha também grama que findava na areia.
Tinha um guarda-casa que só fazia dormir sono despreocupado em guardar, e nem sequer latia.
Gente, onda, biquini, picolé Rochinha, cadeira e canga.
As duas meninas e os dois.
Os quatro.
Cinco, com a praia.
Tinha cheiro de descanso e encontro com a diferença.
Era engraçado.
Foram 3 dias.
Incontáveis risadas e suspiros de vida leve.
Tinha sol, o vento soprava, areia era fria e as meninas confabulavam.
Todo mundo se mostrava, alguns se desencontravam.
Estrela tinha de sobra.
Cadente só quem olhou demais viu. Pedido todo mundo fez.
Um falou, o outro riu, o de cá calou e o quarto só olhou.
Os meninos surfaram.
As meninas se alongaram e caminharam. Também nadaram.
Peixe, suco e torta de paçoca.
Segunda-feira chegou.
Choveu na volta.
Acabou.
A cidade grande voltou.
E as meninas querem mais.
Agora dizem que vão trocar as asas por pranchas.
E haja onda!

A Maricota escreveu:


Em tempo
Ainda falta um tanto pra sessão começar, mas Manuela quer sair de casa porque faz um frio que não passa e ela sente que só andando um pouco e olhando tudo em volta pra sentir algum calor subindo pelas extremidades. Chama a rua, se espalha em ladeiras e assunta tudo com os dois olhos porque é isso que sabe fazer. Vigiar o entorno, engolir as pistas que os outros deixam caminho afora sem nem desconfiar que o mundo anda infestado daqueles que engolem vestígios de vidas alheias.

Mais um quarteirão e já avista o carrinho de pipoca meio tombado e ignorado porque nunca tem pipoca quente no momento exato. Fica ali de assombração na porta do cinema, um objeto de cena que, pra Manuela, nunca consegue dizer nada. Um carrinho mudo. Sem filas, uma boa ter chegado cedo, ela surrupia beijos e olhares dos cartazes promissores e escolhe algum que vai esquentar seus delírios por pelo menos duas horas dessa tarde - que continua fria.

Ainda falta um tanto pra sessão começar e por isso Manuela espia o saguão de ponta a ponta, sem espasmos de pressa – anda, pára, prefere sentar no canto para um café grande que vai dilatar sua pupila e fazer o pulso palpitar mais agoniado. Inspira. Ali atrás do balcão, uma mulher-bomboniére com cachos vermelhos emotivos e os braços arrepiados. Ela não vai assistir a nenhum filme. Mas vai continuar lançando cílios lambidos em cima do novo garçon, que desponta terno entre as mesas sem, claro, nem desconfiar que o mundo anda infestado daqueles que engolem vestígios de vidas alheias.

Do lado dela, um moço que espera com um copo inteiro de suco turvo pela frente e logo ali atrás, um par de amigas entediadas em escutar os dilemas uma da outra - mas os sorrisos são honrados. Manuela suspira. Porque o filme ainda nem começou.
Maria Lutterbach, a Maricota, aquela fofa.

Friday, June 09, 2006

Bateu, e voltou.

Acho que ele não entendeu nada, também pudera....
Como explicar arrependimento?
Melhor é previnir.
Deveria existir vacina contra vacilos.
Analgésico, pra curar ressaca moral.
Ai ai... um dia eu ainda faço uma plástica pra tirar de dentro do peito o tal do impulso!
Será que dá pra dividir no cartão?

Monday, June 05, 2006

Que gente é essa?

Na sexta, eu ouvi jazz em meio a livros e bons amigos.
No sábado, eu chorei quando o noivo entrou na igreja ao som de Beatles.
No domingo, eu vi adolescentes brigando como bichos em guerra por território. Antes fossem animais agindo por instinto. Não eram. Eram pessoas com maldade nos olhos, covardia no soco, deboche na instalação da desordem.
Na segunda, eu senti raiva dos homens.
Na terça, ainda não sei...
No próximo final de semana, não quero domingo.
Na vida afora, levo comigo o desejo de gente menos bicho.

Friday, June 02, 2006

Até que a morte nos encare

- Casa comigo?


- Eu caso. De vestido branco, com flores no cabelo, de coração acelerado, com as mãos tremendo.Caso. No meio de um campo aberto, com a lua cheia. Vou casar. Pra viver dois e ser um, pra ter vários, pra ver envelhecer, pra não deixar esse amor morrer, pra eu nunca ter que te esquecer... pra gente dançar muito, até a noite amanhecer.

Thursday, June 01, 2006

Gentrificado

Gentrificação: Processo de restauração e/ou melhoria de propriedade urbana deteriorada. Realizada pela classe média ou emergente. Geralmente resultando na remoção de população de baixa renda.

Resolve?

Barulho calado

Em meio ao ronco estonteante dos carros e das vozes frenéticas de milhares de ambulantes que compõe a música cotidiana daquela rua, ela se prendia no silêncio de si mesma. Parecia que todos os sentidos tinham se escondido atrás dessa angústia que fazia ela perder toda a curiosidade pelo mundo do lado de fora. Não via as cores do dia, não cheirava o perfume das pessoas, não sentia o frio que ventava no rosto. Só o silêncio pairava.

Pensou em entrar em um cinema qualquer e ver o primeiro filme da programação, que fosse de terror, que ela nunca gostou, sentia medo. Mas a intenção era calar aquele barulho de nada dentro do peito, era viver uma outra estória que não fosse a dela, tão sem emoção, sem trilha sonora, sem mocinho. O bandido existia, e foi ele quem roubou o final feliz. Passou... nenhum filme , por pior que fosse, valeria a pena ser visto por uma espectadora tão sem olhos.
E ela andava, perambulava pelas ruas sem rumo e sem vontade. Queria parar. Parar o tempo, parar a cabeça, parar os homens, parar a fita da vida e retrocedê-la, para deletar aquele dia. Viu que não podia, não era Deus. Ele nunca passaria imune por um cego moribundo apoiado em sua vareta na calçada, esperando ajuda para atravessar a avenida. Ela o fez, e nem viu. Um café. Com quem? Para que? Ela nem gostava de café, só o cheiro valia a pena mas, nem isso naquele dia.
O caminho de casa estava cada vez mais distante, não importava. Mais do que geograficamente perdida, a menina chorona estava num labirinto interno. E o silêncio insistia dolorosamente, cruelmente, assustadoramente. Meu Deus...e agora? Pediu então, sem voz e sem esperança, para ser criança de colo. Prá ser bicho sem razão. Prá ser nuvem sem corpo. Prá ser qualquer coisa que não fosse gente. Absurdos, nenhum maior que o desespero daquele silêncio vorazmente interminável.
E, depois de uma eternidade presa nestes sessenta minutos, ela se rendeu a uma interferência externa ao seu mundo calado. Sentiu um toque quente e forte no ombro. Fechou os olhos e, antes mesmo de olhar prá trás, escutou a orquestra de businas da hora do ruch. "Pronto! Estou livre!", ela pensou. E, numa fração de segundos, se encantou com as cores e sabores dos sorvetes expostos na vitrine da loja logo a sua frente. Nem sequer olhou para trás, para ver de quem era aquela mão que pairou sob suas costas. Provavelmente era um pedido de desculpas por um esbarrão de corpos nos meio da multidão. A dúvida não coube naquela hora, foi maior descobrir que o que faltava era isso, um toque, vindo de onde for. Para calar o silêncio palavras não bastavam a ela, o calor de um toque sim.
Solidão. Ah pobre menina... até hoje não aprendeu a viver nesse mundo grande de meu Deus.
Ilustração de Caroline Hwang.

Friday, May 26, 2006

Para pensar

"Se não se pode escrever um novo começo, é preciso recomeçar escrevendo um final diferente."
Viviane Senna, sobre a educação nacional, na cerimônia do 8º Grande Prêmio de Jornalismo do Instituto Ayrton Senna.

Wednesday, May 24, 2006

Aprende Manuella, aprende...



"A gente olha e pensa: quando aperto? Agora?Agora? Agora? Entende? A emoção vai subindo e, de repente, pronto. É como um orgasmo, tem uma hora que explode. Ou temos o instante certo, ou o perdemos para sempre. E não podemos recomeçar. O desenho é uma meditação, enquanto a fotografia é um tiro. Pode-se apagar um desenho e fazer outro. Não se está lutando contra o tempo. Tem-se todo tempo pela frente, é uma meditação. Mas com a foto há uma espécie de angústia constante pelo fato de estar presente. Mas é uma angústia muito calma."

Henri Cartier-Bresson, foda!

E olha o que fizeram com o amor:

"O amor é igual capim. A gente planta e ele cresce. Depois, vem uma vaca e acaba com tudo."

Friday, May 19, 2006

DevANeiO VesPerTiNO

Vontade de tomar sorvete.
De nadar, em uma piscina de sorvete.
Como naquele filme, a velhinha mergulhando num balde muito grande de macarrão.
Era uma cena muito gostosa, mesmo pra quem não come macarrão. Será que existe alguém que não gosta de macarrão? Quando eu era criança eu adorava, acho que porque era divertido comer, minha mãe é que nunca achava graça na bagunça.
Às vezes, eu gosto de tirar as coisas de ordem, sabe? Alguém falou que desorganizando a gente pode se organizar, e é bem verdade. Talvez o quadro fique mais bonito na varanda do que na sala. Tirar do lugar sempre implica em outro olhar sob o que ficou e o que vai ser.
O que você gostaria de ser se não fosse gente? Parece pergunta de dinâmica de grupo pra entrevista de emprego. Eu perderia a vaga se dissesse que queria ser água, acho que os bichos são sempre a resposta esperada.
Hoje terminei de ler aquele livro que ganhei semana passada. Todas as respostas que eu imaginei para o crime perfeito do bandido eu perdi na última página. É bom ser surpreendida pelo inesperado, todo mundo deveria fazer uma surpresa pra alguém que gosta.
Tô com saudade de muita gente que eu gosto e também de gostar muito de alguém. Existem vários tipos de gostar, apesar de todos serem gostosos. É como se o amor de mãe fosse azul, pelo amigo, verde, e assim por diante. Eu estou querendo gostar vermelho, mas essas coisas a gente não escolhe, um dia você acorda e vê o mundo cor-de-rosa, aí sabe que alguma coisa está diferente dentro do peito, que agora tem cor de maçã.
Boa idéia, vou comer uma fruta. Sabe do que mais? Vou fazer uma salada de frutas, pra tomar com sorvete. Hoje eu acordei com vontade de tomar sorvete.
Tchau e benção!

Monday, May 15, 2006

São Paulo, 15 de maio de 2006.

E a rua, que era cheia de gente, não tem ninguém.
Nem o baleiro da esquina teve coragem de aparecer.
A segunda-feira preguiçosa deu lugar a um sentimento estranho de medo.
E eu saí mais cedo do trabalho, assustada com a idéia de ser achada por uma bala perdida.
Mais do que isso, triste, por não conseguir entender o que fizeram com o respeito entre os homens, onde esconderam a liberdade.
Então, eu desligo a televisão, pra não ter que ver e ouvir mais nada disso.
De que adianta? Se amanhã eu não posso trabalhar, se o caos ainda toma por completo a minha rotina...se eu ainda durmo embalada pela sinfonia agoniante das sirenes.

Sunday, May 07, 2006

02.11pm

Bem que eu falei, amanhã é outro dia.
Tudo bem.
É sempre assim...

Friday, May 05, 2006

09.24pm

Tem dia que o mundo parece tão cruel com a gente...
Vontade de silêncio.
Absoluto.
Mas o telefone toca.
E a gente se rende ao barulho lá fora.
Amanhã tudo volta ao normal.
O mundo e eu somos muito previsíveis.

Wednesday, April 26, 2006

Amo demais!


O relógio do computador diz que são 23.46 e o meu já perdeu seus ponteiros há um bom tempo, se é que um dia o tiveram. Lá fora as pessoas se dividem entre gritos de "goooool" e palavrões que a pobre mãe do juíz nunca pensou ouvir a essa altura da vida.


Na verdade, nada disso me importa. Esta noite de quarta-feira é no meu calendário sem data simplesmente agora. E o que tem no meu agora? Por um minuto me abstraio de noções, sentidos, preocupações, conceitos e desejos. Aqui, entre quatro paredes, algumas portas, muitas janelas, eu. Tudo é muito grande e a noção de espaço está perfeitamente dentro, cabe.


Cabe agradecer aos meus orixás por um dia que tinha tudo pra ser como outro qualquer. Mas não o foi, nunca é e nunca será. Não! Porque nessa quarta-feria sem graça e cheia de graça eu acordei me alimentando de sorrisos largos, olhos brilhantes e esperança latentemente verde!
Não, porque eu amanheci descobrindo que o amor não se restringe à espaços físicos e é tão forte que chega de Salvador até a mim sem gastar nem um tostão. E o mais mágico de tudo é que nem sou eu o personagem dessa estória tão cheia de angústias típicas de finais felizes. Acho que é porque amar não tem direção e nem barreiras, vai de um pro outro como vírus... é só estar perto do primeiro espirro. E uma voz apaixonada ao telefone vem pra me dizer que é sim possível seguir o "flow" da vida e com ele lambuzar a boca de chocolate! Ah Camila minha fulô... como eu te quero bem! Como eu te quero cada vez mais e mais perto do Elevador Lacerda! Há de estar longe de mim, mas nos braços seguros de Oxóssi!

Abençoada seja minha quarta-feira tão cheia desses dois!

O desenho é do Leandro, aquele.... o Lisboa.


Thursday, April 20, 2006

Pega, estica e puxa!

Abrace, e se permita ser abraçado.
Olhe no olho, encoste na mão, deixe o sorriso correr solto. Acaricie.
Pegue no cabelo, estique o braço, aperte as bochechas.
Beije a ponta do nariz, brinque com as orelhas, estale os dedos.
Sopre a nuca, bilisque as pernas, pise nas costas. Massagem.
Enrole pés nos outros, deite no colo, sinta o cheiro.
Puxe a pele, alise a barriga, carregue nas costas.
Feche os olhos.
Faça como, quando, com quem, onde quiser, mas faça.
Deixe o corpo falar, faz bem aos ouvidos da alma.

Acabei de ouvir:

"Uai Manu... você parece diferente hoje. Tá com cara de quem pulou do precipício!"
(Deus meu! Como é a cara de quem pulou do precípício? Provavelmente desconfigurada pela queda, suspeitou meu humor negro...)
"O problema é que você é muito previsível Manu (problema? previsível?). Não adianta esconder os cacos de vidro debaixo do tapete se ainda consigo ver resquícios deles no seus tênis. Mas não se preocupe, estes momentos ímpares do "mundo de Manuella" só são perceptíveis aos que não teriam medo de pular do precipício, mesmo que sem asas como as suas."

(???) (....) (!!!)



(Um precipício é mesmo algo muito grande pra se esconder embaixo do tapete...)

Aberta a gaveta do querer. E eu não quero mais que ela se feche

Eu quero a vida cor de rosa, com todos os “frufrus” e rendinhas e babados na barra da saia.

Quero pisar num chão de brilhantes por onde vi meu amor passar e, por onde meus pés, ainda com aquele band-aid no dedão esquerdo, consigam correr leve e a favor do vento.

Inventar estórias, mundos onde eu possa ser a mentira que eu quiser, tão cheia de verdade, porque será a mais pura expressão do meu desejo de ser o que eu bem entender!

Viver sem ter que me preocupar com o trânsito das seis e usar esta desculpa pra assistir o filme novo de Almodóvar comendo pipoca com groselha, porque eu quero o mundo rosa, e doce, muito doce.

Ah como eu quero! Como eu quero acreditar pra sempre que eu cheguei ao mundo pelo bico da cegonha, que as estrelas nunca morrem, que aquela Caloi Ceci vermelha que tantos “roxos” na canela me trouxe foi Papai Noel quem me deu. E Lobo Mal? Até hoje não durmo com as portas do armário abertas...

Quero acordar com o sol na testa, com os olhos piscando leve e nunca cansados de tanto azul no céu. Cheirando flor, respirando café fresquinho da vizinha, vendo a meninada correndo atrás da bola na rua e ouvindo Vinícius dizer na minha vitrola que tudo isso “porque hoje é sábado”!

Ai ai .... como eu quero, quanto eu quero. Descobrir as curvas do meu rio e com elas aprender a conduzir minha canoa nascente a baixo. Agarrar nos galhos secos das margens, virar o barco quando o vento for mais forte que meu remo, rir de mim mesma, suar horrores pra fugir da correnteza e chegar perto da pedra grande, onde vou parar pra tomar um banho de cachoeira!

Querer não é pecado, não faz “mal pras vistas”, não dói e não tem gosto de jiló. Querer é colocar pontos de exclamação na vida! Eu quero e quero com muita calda de caramelo, com muita purpurina. Quero, muito, tudo, antes, perto, sempre, forte, leve, azul... cada querer no seu lugar, cada lugar no meu mundo, todos os mundos no meu querer.

Monday, April 17, 2006

-"Bom dia! Você dormiu comigo hoje, seu mal educado?"
-"Não! Eu não tive essa oportunidade mas, bem que seria um grande prazer!"

O Tiago é assim, a gente nunca sabe onde ele está.

Uni duni tê salamê minguê!

Fazer a escolha certa e ser uma escolha bem feita. Parecem ser a mesma coisa mas, meus pensamentos inquietos concluíram o contrário a partir de um "trabalho de campo" vivido nos últimos dias. Existe sim uma grande diferença, só que nem sempre perceptível a olhos nus, é preciso um pouco mais de ousadia ocular, ou qualquer coisa que dê muito errado pra te fazer pensar nisso com tanta veemência. E eu escolho as duas opções acima, mesmo sem saber se vou perder pontos por isso ou vou ter a questão anulada por indecisão explícita.
Na verdade isso tudo é muito perigoso, porque anda de mãos dadas com o arrependimento. "Antes eu não tivesse aberto aquela porta. Por que eu não fui àquele jantar?" E blá blá blá blá... Tá, tudo bem. Até aí o problema é seu, aliás, só seu, porque a decisão foi tomada por você mesmo. Mas tem hora que, em consequência da sua, vem a de outra pessoa. Ou seja, ao fazer uma escolha você acaba sendo a escolha de outro alguém. E pra piorar ainda mais vem a noção de certo e errado. Pronto! Já era!
Eu pulei a janela certa, ainda que afirme sem certeza absoluta. Mas acredito, também longe da convicção plena, que não fui a escolha mais adequada, digamos. E aí vem o "ponto X" da excruzilhada: você escolhe a cuz ou a espada?
Eu escolho a cabeça, não pra ser martelada pela cruz ou furada pela espada, mas pra tentar calcular a altura da janela pulada, dividir pelas costelas quebradas na queda, subtrair pelo medo do novo e somar tudo à uma boa dose de vontade de aprender. Talvez assim, a lógica da minha equação seja positiva o suficiente pra me convencer de que a ordem dos fatores não altera o produto.
Conjugar o verbo "escolher" diariamente, seja ele intransitivo direto ou transitivo indireto , não é tão simples quanto os outros verbos o são. Primeiro porque, pra que a conjugação seja feita de forma perfeita, ou no mínimo justa, é preciso que seja no plural. Como se eu e você tivéssemos pedido picolé sabor limão e o vendedor tivesse que escolher pra quem dar o último deles.
Depois, porque é preciso um bocado de esperteza pra poder dicernir o que realmente é rentável em uma escolha dessas. Pensar se vale mesmo a pena se arriscar em algo que você não tem a mínima idéia de certeza ou final feliz. Daí o perigo que remete ao pensamento anterior, o egoísmo, o egocentrismo.
Mas, no final das contas matemáticas e das conjugações verbais, a minha escolha teve algo de muito positivo. Mesmo que não tudo, difícil agradar à gregos e troianos, ainda que com o jeitinho brasileiro. Escolher talvez seja uma das maiores alegrias presentes no meu dia a dia, a gaveta que mais tenho aberto e fechado com frequência impressionante! Porque escolher remete à maior das características da vida de uma borboleta, a liberdade... E é nela que eu me agarro, na grandeza de vôos livres, tanto para erros quanto para acertos. Na leveza de bater asas por traçados incertos, mas sempre, sempre atenta aos que voam comigo pra um lugar onde há de reinar o bem.

Wednesday, April 05, 2006

E agora José?


É uma briga bem árdua...
Como se fosse o desejo e sua armadura de ferro contra o medo e sua espada pontiaguda.
E no meio desse duelo, eu. Sem armas, sem proteção, sem nem saber mais pra que lado correr.
Correr de que?
Eu nunca tive medo de pular, mesmo que do alto.
Talvez eu não saiba ainda a diferença entre pular e valer a pena se arriscar.
Não gosto disso.
Prefiro nadar no rio.
Catar goiaba no pé.

Tuesday, April 04, 2006

Inocência onde ela nunca mora.

A mãe: "Tá vendo aqueles meninos ali em baixo daquela ponte? Eles não tem onde morar e muito menos o que comer. Sabe aquele arroz e feijão que você desperdiça todo dia no almoço? Pois é... eles não têm nem isso".


O filho: "Então como é que aquela menininha ali está com a barriga muito maior que a minha"?
Fez-se silêncio generalizado no ônibus.

Dia de Fred

Hoje eu ouvi a voz do Fred.
Tinha tanto tempo que eu não sabia por onde o Fred andava...
Será que ele ainda gosta de comer flores na salada?
Depois de anos, mesmo longe, ainda sinto o Fred mais perto que nunca!
Deve ser por isso que dizem que a saudade é ser, e depois ter.

Wednesday, March 29, 2006

????

Será que eu nunca vou parar de escrever coisas tão sem sentido?
Tô de mal a pior....
E morro de rir!

Sede.

E no final da noite, quando a hora de ir embora já havia se perdido na pista de dança, ela ainda queria mais.
Mais o que? Mais de quem? Mais pra que?
Ela nunca sabe as respostas, mas naquela noite foi fácil encontrá-las.
Ele veio... pra dar mais o que ela tinha de menos e queria tanto.

Monday, March 27, 2006

Eu gosto de brincos e coisinhas de enfeitar o cabelo...
Também gosto de saias que rodam e deixam o vento entrar rasteiro.
Mas ainda prefiro aquele nariz vermelho de palhaço, que ganhei quando me despia de tudo aquilo que eu gosto pra me enfeitar.

Friday, March 24, 2006

Eu e ele.

"Ô tia!
Me dá um real aí pra comprá um negócio de comê ali?
Tem dois dia que eu não como nada."
(com uma garrafa cheia de cola escondida debaixo da blusa)
Chovia muito, as pessoas se espremiam debaixo do único ponto de ônibus naquela rua. Ele, bermuda rasgada na bunda, blusa suja e apenas um pé de chinelo. 23 anos, mais ou menos. Alto, cabelo raspado, sem dentes. Expressão forte. Estranho. Vagava sem medo de ser atingido pela chuva. Na verdade, era incrivelente capaz de desviar dos pingos, maladragem da vida na rua.
E, em meio àquela confusão de gente, ônibus, água, sombrinhas e cansaço de final do dia, ele parava com a mão estendida e dizia o texto que soava inutilmente aos ouvidos alheios. Uns se afastavam em um silêncio trêmulo, outros por medo de uma reação mais brusca diante do "Não!" sacavam moedinhas dos bolsos.
Eu seguia seus passos com os olhos esperando a minha vez de ouvir o texto incansável e molhado. Enquanto isso, pensava em qual seria a minha reação. "Não! Não acho bacana dar dinheiro, talvez possa comprar uma prato de comida na lanchonete ali da frente e alimentar o seu texto faminto pelas próximas horas." Mas ele não vinha....
Me olhava com uma mistura estranha de pudor, medo, admiração, não sabia como olhar, na verdade. Desviava de mim, mais do que dos pingos de chuva amarrotando minhas possibilidades de ir até ele. Não, ele não vinha cuspir seu texto decorado em mim, mas por que não? Eu queria sim ajudar com mais do que simples e simbólicas moedinhas. Não tinha medo, era como se quisesse muito me aproximar dele. E ele só se esvaía de mim.
Foi então que, depois de mais de dez minutos de observação, de três ou quatro ônibus perdidos, eu consegui ter uma idéia do que se passava. Vergonha. E eu senti, mais uma vez, um soco no estômago. Os olhos que assustavam pela amargura agora eu via com uma inocência nunca imaginada. Percebi que a minha presença ali o incomodava mais e mais a cada segundo.
Atrás da bermuda rasgada, da cara de mau, da garrafa de cola, tinha um homem como todo e qualquer outro. Com desejos e sentimentos. Tinha mais, tinha fome e tinha respeito também. Eu me incomodei por incomodar. Resolvi pegar o primeiro ônibus e deixá-lo a vontade, ainda que com fome.
Foi uma viagem difícil de volta pra casa. Presa na surpresa de me deparar com um olhar tão cheio de pudor onde nunca pensei encontrar. Não sei, foi estranho pra mim não saber que nem sempre as pessoas te vêem como você pensa que é visto. E mais, perceber que meus olhos também precisam se livrar do vício de ver o prédio inteiro, quando o que relamente importa é só uma janela.

Tuesday, March 21, 2006

...

- Coca-Cola ou suco de laranja?
- Laranja, sem gás, por favor.


E o garçom olhou para ela escondendo o susto dentro da gravata borboleta e pensou: "Tudo bem, doses diárias de nonsense não fazem mal à ninguém."
Em seguida respondeu:
- Claro, suco de laranja sem gás. Desculpe senhora, mas gostaria de laranjas quadradas ou retangulares para seu suco?

Monday, March 20, 2006

Pela janela do ônibus eu vi:

"Crianças circulam livremente. A situação está novamente sob seu domínio."
Frase escrita numa das partes de um viaduto paulistano que assiste, diariamente, crianças cheirando cola e se deixando levar.

"Seu domínio". Meu ou da situação?

Money for nothing.


"Dinheiro é um pedaço de papel. O céu é um. O céu na foto é um pedaço de papel. Pega fogo fácil. Depois de queimar o dinheiro vai para o céu como fumaça. Também é fácil rasgar como cartas e fotografias. Aí não se usa mais. Pode até remendar com durex, mas não é todo mundo que aceita. O que não se quer melhor não comprar. O que não se quer mais melhor jogar fora que guardar em casa. Dinheiro tem valor quando se gasta. Um pedaço de papel é um pedaço de papel. Dinheiro não se leva para o céu."
Arnaldo Antunes.

No chão, última página de uma revista velha e perdida no Banco do Brasil da Avenida Paulista. Bem ao lado do caixa eletrônico onde acabava de pagar contas de luz e telefone. Exatamente na hora em que eu franzia a testa, tipicamente reclamando da falta de dinheiro.

Sunday, March 19, 2006

Sai do meu pé chulé!

Ela sempre está aqui.
Presente e onipotente. Fala baixinho, mas faz um barulho de ensurdecer.
Quando eu quero verde, ela grita pelo azul. É sempre assim.

Por vezes eu tento ignorar, fico sem paciência com ela e tampo os ouvidos. Bobagem a minha, não se cala.
Então eu ouço e me importo com ela. Pelo menos finjo, por segundos. Tá bom! Mais, por horas.
Na maioria das vezes chega sem o maior nexo. Mas vem e pisa com pé sujo nas minhas certezas que, nessa hora, já não o são mais. Tem hora que ela estraga tudo. Mas eu sempre permito sua presença. Dividimos a culpa, sou justa com ela.
Parece que quer ser mais e mais forte, deve achar que eu sou boba e vou me render às suas baboseiras. Boba é tu tatu!

Já tentei colocar num saco fechado e soltar lá no centro velho de São Paulo, pra ver se esquece o caminho de casa e some de vez. Também pensei em bater no liquidificador pra ficar mais fácil de empurrar pelo ralo. Nessas horas fico assustada com a sua força.

Quando eu sou reta, ela é curva. E eu caio da corda que custei tanto pra conseguir me equilibrar.
E eu penso,penso, penso. E ela se alimenta de bagunçar meus pensamentos. Ri da minha cara, sem dó.
Até quando eu durmo ela não se aquieta. Mas, quando é assim, é menos voraz, porque se disfarça atrás dos sonhos.
E, depois de me render à Orfeu, ela toma meu café sem nem pedir. Tira o disfarce e volta com cara de quem não me vê há tempos.
Hipócrita! Pouco importa a minha opinião. Ela se acha muito auto-suficiente, apesar de saber que sem mim não tem razão de ser.

Na verdade, a nossa relação é de amor e ódio. Um pouco de um e de outro.Por vezes, mais de um que o outro.
Agora são 14.46 de um domingo pé de cachimbo. Eu aqui, cuspindo meu desabafo e ela querendo apagar tudo.
Acho melhor sentar na varanda, fumar um cigarro e me distrair com a empolgação das pessoas no churrasco do vizinho.
Eu vou... e ela está aqui (como me incomoda essa voz ao fundo!), me dizendo pieguices sobre o mal que o cigarro faz.
Um dia eu ainda consigo me livrar dela, ah consigo! Quem sabe quando eu olhar pra dentro e aceitar que essa voz no meu ouvido, nada mais é do que a minha mania de nunca saber ao certo onde, como, quando e por quê.

Tuesday, February 21, 2006

Tarde de um dia 21.

Tá chovendo, forte...

Eu não tenho guarda- chuvas, nunca tive um, acho que eles não me guardam bem. Além do que, sempre penso que vou ter os olhos furados por aquelas armações ponteagudas carregadas pelos que são menores que eu e passam ao meu lado como se fossem "tirar o pai da forca". Tenho um pouco de raiva deles, cofesso. Dos guarda-chuvas, não das pessoas.

Tinha uma capa de plástico, mas ela furou, a água entra pelo buraquinho que só faz aumentar a cada dia molhado. Acho que vou jogá-la fora, mas eu gosto do tom azul, é forte... Não adianta, não pode deter a chuva, que também é. Uma pena!

Eu posso correr, talvez me molhe menos. Também posso pisar numa poça no meio da correria e encharcar os pés. Quando eles estão molhados eu sinto muito frio. Acho que posso acelerar os passos e ficar atenta ao chão. Procurar marquises e esperar o sinal ficar verde dentro da lanchonete.

Entrar no primeiro ônibus e fazer baldiações até em casa, o Pq. Continental 874C demora pra passar. Mas aí eu penso em janelas fechadas e embaçadas, dezenas de inspirações e expirações sincronizadas, corpos molhados e apertados. Todo mundo corre da chuva, também corro eu, mesmo não sendo de açúcar.

E não pára de chover. Eu então decidi a ela me entregar. Porque descobri que, mesmo que eu tivesse o maior dos guarda-chuvas pra me guardar, a capa mais impermeável pra me proteger, a marquise mais larga pra me esconder e um ônibus super ventilado só pra mim, eu ainda assim estaria molhada.
Porque chove forte, chove sem parar. Aqui dentro, onde não são só nuvens que fazem o céu desabar.

Monday, February 13, 2006

Não conte pra ninguém...

"Pra guardar um segredo bem guardado, você faz um buraco no tronco de uma árvore no alto da montanha. Sussure suas palavras lá dentro. Depois você tampa o buraco com barro, assim, ninguém nunca vai saber o seu segredo."

Saturday, February 11, 2006

Numa noite de sexta-feira, me despedindo de alguém que passou por mim, sentadas ao meu lado eu encontrei:

"Estas lembranças são intermitentes e, por momentos, me escapam porque a vida é exatamente assim. A intermitência do sonho nos permite suportar os dias de trabalho. Muitas de minhas lembranças se toldaram ao evocá-las, viraram pó como cristal irremediavelmente ferido."

Pablo Neruda

Friday, February 03, 2006

Uma vida grande sem ter que ser "gente grande".

Quando eu for gente grande, eu quero ser só gente, o grande eu vou jogar no lixo. Dizem que dá muito trabalho, os adultos são sempre cheios de problemas, além do que, sempre ouço pelos cantos da casa "se eu te contar minha vida embaixo de um pé de amora você chora!". Tudo parece muito longe e inalcansável, nunca os braços são suficientemente grandes pra conquistar o que se deseja.
Aí eu penso que talvez eles, os que são gente grande, não são inteligentes o bastante pra pensar em coisas muito simples. Olha só: meu livro preferido está no alto da estante e eu quero muito lê-lo mas não consigo porque tenho 1.65m e a prateleira tem 2 metros. Mesmo assim não me atrevo a desistir da leitura. Se olhar um pouquinho para os lados, avisto um banquinho que pode me alçar, uma vassoura que pode ser a continuação imaginária dos meus braços ou posso arriscar pulos que empurrarão todos os ourtos abaixo, mas o que quero, há de estar no meio deles.
Parece idiota da minha parte, ou muito pretencioso, acreditar que tenho soluções para coisas que os que já acumulam um número muito maior de anos vividos do que eu ainda não se deram conta. Mas eu sigo com interrogações pulsantes na cabeça sobre as dificuldades de ser adulto. Eu acho mesmo é que não fui feita para a constância dessa vida.
Os homens estão sempre pre-ocupados com o trabalho que alguém um dia postulou que enobrece. Mergulhados em contratos, cotações, apólices, reuniões, projetos, papéis e mais papéis. A vida fora desse mundo é sempre afogada em um mar de reclamações porque, apesar de horas diárias de escritório, as contas do final do mês ainda estão de férias na gaveta da sala. É... férias, só delas mesmo, porque a desses pobres homens vão ficar pro ano que vem, que sempre vem, mas nunca chega! E a vida vai passando pela janela da empresa, e o gosto amargo do trabalho insatisfatório vai crescendo na boca, e os amigos vão sendo promovidos e eles se mantém firmes, guerreiros de uma batalha já perdida, porque lhes foi ensinado que o trabalho enobrece, mesmo que lhes custe uma vida vã.
E as suas mulheres? Esposas de um terno e uma gravata que chegam em casa sem nem mesmo sair do trabalho. É tanta dor de cabeça, tanto problema que não cabe na cama de casal. O jantar está na mesa, o banho preparado e todo amor que lhes foi prometido "até que a morte os separe" vem sendo assassinado a cada final do dia, porque hoje um negócio foi perdido e não há cabeça para isso. Mas algumas vezes, nem tão esporádicas assim, eles se deitam e fazem um carinho singelo típico de quem agradece por uma esposa tão dedicada. Isso, porque a mulher de carne, osso e peitos eles já encontraram numa cama redonda com espelhos no teto. E ela, sabendo disso, fecha os olhos e se cala num silêncio doído, engolindo a seco desenhos invejosos daquela figura que tem do seu marido mais que os restos diários de um homem de negócios . E mais um dia se perde no conformismo da vida dela, porque um dia alguém lhe disse que os homens são assim mesmo.
Aí surgem as reticências biológicas desse parêntese que é ser gente grande. Os filhos, os personagens mais sábios do livro que lemos diariamente desde que viemos ao mundo. Para eles, tudo não passa de uma brincadeira de criança, e não haveria de ser diferente. A tristeza da mamãe não é mais que uma dor de cabeça passageira e o mau humor do papai é só "um pouco de indisposição", seja lá o que isso for, não deve ser nada sério. Tudo é divertido e o maior problema que se tem é ter que ir para a escola e interromper o jogo com os amiguinhos da rua.
Daí eles vão crescendo e conquistando olhos mais perceptivos ao que se passa. Foi aí, nesse processo de adquirir lentes mais "profissionais" para fotografar a vida que eu optei pela simplicidade. Por saber de tudo isso que eu te contei, por ouvir tudo o que já ouvi, eu acredito que ser adulto não deve ser algo que me caiba. Talvez, daqui há uns bons anos, eu me veja exatamente com a vida que tanto renego. Tudo bem, também sempre ouço que "o futuro a Deus pertence"! Mas serei livre do peso de que tudo isso me foi imposto, terei em mim a certeza de que eu escolhi viver essa tal vida adulta cheia de nuvens. Mas, enquanto puder, vou seguindo em meus devaneios soltos e crendo piamente que eu não sei viver a intensidade amarga da vida adulta, e nem quero saber! Um dia eu te conto, se é mesmo preciso ser gente e grande ao mesmo tempo!

Wednesday, January 25, 2006

Hoje eu acreditei...



Os céus vêm pra quem quer mas, as asas, só mesmo pra quem tem.

Monday, January 16, 2006

Surpresa engavetada.

Ontem eu senti medo. Mais do que eu já tive do escuro. Porque foi medo de um escuridão interna, num lugar onde vi meus braços muito curtos para alcançar o interruptor. Um labirinto sem fim, onde meus pensamentos chegaram a ter pernas bambas e cansadas de tanto procurar a luz e um banquinho pra se sentar, pelo menos um pouco.
E
a cada manifestação doída desse medo, mais e mais ele ganhava força porque, até então, eu acreditava na sua ausência absoluta. Mania de mulher maravilha... Foi como se algo tivesse me obrigado a revirar aquelas gavetas submersas no esquecimento e nelas econtrar algo muito menos leve que um simples devaneio. E eu reencontrei o medo. Do mundo lá fora, do meu aqui dentro, parecendo criança assustada com os monstros do armário, agora escondidos nas minhas gavetas.
M
as, o que mais me incomodou, na verdade, foi perceber que nunca estive totalmente imune à esse sentimento, só não mais me permitia saber da sua existência. Queria sempre escondê-lo debaixo de uma carta de amor, de uma revista velha, de um fotografia bonita. Mas ocultar não significa eliminar, e eu não entendia isso, até ontem.
E
eu chorei lágrimas de criança medrosa, eu esmaguei a minha coragem, eu quebrei todas as minhas certezas, eu amarrotei as minhas esperanças. Catei meus pedaços no chão do quarto e tentei colá-los com palavras bonitas despejadas num papel, e que de nada adiantaram. Elas não existiam, nem mesmo pra amolecer meu soco, muito menos pra intimidar meu medo.
E
ra uma sensação estranha de pisar em chão de espinhos e ao mesmo tempo escorregar em sabão. E eu escolhi o sabão, sem nem mesmo saber se me foi dado o direito da escolha. Eu me entreguei ao sono que veio chegando pela ponta dos pés e tomando por inteiro meu corpo cansado de um dia medroso. Os olhos caíram pesados, a boca fechou seca, a cabeça deitou-se silenciosa e o peito aquietou-se ainda ofegante.
O
ntem eu senti medo. Me despi da fantasia azul e vermelha da heroína que um dia prometi a mim mesma sempre ser. E hoje, quando eu acordei, ela estava pendurada na cadeira ao lado da minha cama, apenas uma fantasia. Eu abri a porta do armário e não encontrei os monstros, lavei o rosto cheio da noite passada, sentei-me na frente do espelho e me enxerguei diferente. Então abri a porta do dia e fechei aquela gaveta. Mas, antes de fechá-la, tirei os entulhos, passei pano limpo, reorganizei as fotos e ao lado das cartas de amor e das revistas deixei o medo. Agora eu já sabia onde ele estava, jamais doeria tanto reencontrá-lo numa noite escura de segunda-feira.

Wednesday, January 11, 2006

Final da história

Para que seus camelos se eu ainda tenho borboletas no estômago?

Friday, January 06, 2006

Moças de respeito

As fotos eram lindas, os desenhos carregavam (porque eram mesmo pesados) traços de criança. As palavras eram firmes, algumas soavam como pequenos poemas. Tristes, presos, vozes caladas, letras mais cruéis que o silêncio. Algumas premiadas, outras convidadas, todas maquiadas.
Mulheres, flores, muros, corpo, quatro paredes, mini saia, olhos adormecidos. Liberdade é só uma paroxítona terminada em "e", e quando o é. Por vezes, uma saudade doída desse sentimento foi cuspida naqueles biombos no meio de um shopping na Avenida Paulista. E os que compravam uma blusa nova, as que acharam o biquini mais bonito de suas vidas, os que acabaram de almoçar, os que vieram só pra desfilar mesmo, passam inertes por entre elas.
Aquelas mulheres... duras, secas e pacientes assistiam a vida passar lá fora, pelo menos numa exposição fotográfica. E eu, que usava aquele corredor como atalho diário pro meu trabalho, neste dia tomei um soco no estômago. Tão forte foi o medo de perder minhas asas, como aquelas presidiárias nunca tiverem antes.

Wednesday, January 04, 2006

Novidade


A menina só queria se despedir daqueles momentos de cambalhota. E ela abriu a porta do dia, o primeiro, com folhas brancas para mais 365 linhas. E ele estava lá, com braços abertos pro infinito. E a página virou, e a menina virou também... outra menina, mais entregue à braços e menos distante do infinito.

Thursday, December 29, 2005

Butterfly... fly...fly...fly...

"Alegres por serem livres e livres por serem alegres, borboletas não se importam com o presente. Presenteiam harmonia para que as fotografias do mundo sejam belas e perfeitas..."

Tuesday, December 27, 2005

Despedida

Foi tanto brilho, tanta luz que eu não te vi sair. A porta bateu, você do outro lado e eu nada ouvi, porque a música era mais alta e não me permitiu escutar seus passos.
E agora a sala está vazia... e eu preciso fazer a minha mudança. Não dá mais pra dividir o lugar comum com a sua falta me completando pelos quatro cantos da casa.
Estou me despedindo do seu eu, que tão leve e tão rápido me acometeu.
Agora fechando a mesma porta pela qual você saiu. Sem brilho, sem música, doído. Vou em busca de janelas, em uma casa não tão bonita, mas com paredes mais firmes.

Tuesday, December 20, 2005

Achados e perdidos


Era uma Caloi vermelha e cinza, com cestinha e tudo mais. Menos rodinhas, eu já era cheia o suficiente dos meus 10 anos de idade. Na minha garupa vinha sempre o sussurro ligeiro de um ventinho debaixo da blusa. No rosto, o sopro frio e vermelho de Iansã. Naquela época, eu descobri que se não fosse gente seria uma bicicleta, longe do romantismo das meninas flores e "Barbies". Acreditava que com rodas tão velozes poderia ser a namorada mais fiel do vento. Hoje achei esta lembrança em uma das minhas gavetas empoeiradas, quando senti vontade de me deixar levar como folha seca, no meio do vendaval.

Thursday, December 15, 2005

Carta para Papai Noel

... um moço lindo, de olhos cor de estrela, que me abrace durante a noite arrancando do meu dicionário a palavra medo. Alguém que saiba usar o silêncio pra dizer que me ama, que respeite minhas vírgulas e seja meu ponto final. Pode ser um homem, um menino, um moço, um Antônio, um Lucas, André... alguém que realmente seja meu e me queira seu.

Ps: a árvore fica no meu quarto, pode colocar o presente na minha cama mesmo...

Wednesday, December 14, 2005

Doido ele, doída eu.

Voltando de mais uma aula semanal de circo, ali na Franciso Matarazzo, ao lado do viaduto Pompéia, um cara paralisou meus passos por uns bons dez minutos da minha hora tão ausente desses mesmos.

Seria um louco qualquer, desses que a gente vê aos montes vagando pelas ruas das grandes cidades, não fosse pelo sentimento que seus gestos, quase uma performance, causaram em mim. Era velho, mais de 60 tenho certeza que já tinha. Usava barba, creio eu não por opção estética, quase nenhuma roupa e uma expressão ímpar de alegria.

Acho que foi esse sorriso sem dente algum que me trouxe à tona uma pergunta rasgando a razão: o que será que ele estaria pensando? O que pensam as pessoas que rotulamos “doidas” por esbarrarem nas arestas do nosso tão quadrado padrão social de normalidade? Se estivesse no programa do Sílvio Santos com um fone no ouvido, presa em uma cabine sem som, trocaria um milhão de reais por dez minutos daqueles pensamentos. Pode parecer ridículo, e eu sei que é, mas trocaria mesmo assim.

Foi então que comecei a perceber minha imaginação se rendendo à inúmeras possibilidades sobre aquele mundo, tipo um certo desenho animado chamado “O Mundo de Bob”, sabe? Não sei o que ele pensava enquanto articulava os braços de um lado para o outro, enquanto desenhava com as pernas uma meia lua no chão molhado e ria, ria muito. Sei que ele não pensava na cassação do José Dirceu e suas consequências político-nacionais, não lembrava que amanhã é dia mundial da luta contra a Aids, nem se quer sabia que dezenas de iraquianos morriam na suja e hipócrita tentativa dos EUA de impor sua soberania sob os quatro cantos do mundo.

Certamente ele não sabia que hoje é dia 01 de dezembro de 2005, que o ano tem 365 dias, que as horas passam a cada 60 minutos, quantos anos de vida ele teria e muito menos quantos mais queria ter. Não fazia idéia dos desastres naturais que a Terra tem visto com frequência assustadora, do desrespeito absurdo com o qual os homens têm se tratado, apesar de ser filho legítimo do casamento entre a desigualdade e o descaso social.

Aquele cara também não conhecia as lindas praias do litoral baiano, talvez nunca tivesse sentido cheiro de perfume ou participado de uma roda de samba. Será que já tinha se deitado em cama quente num dia de chuva? Comido estrogonofe com batata frita? Não sei, possibilidades muito remotas, respostas que talvez nem ele pudesse me dar.

E no final da minha análise, da minha furtiva crise de curiosidade, cheguei à conclusão de que o mundo desse cara, a cabeça dele, talvez fosse muito mais esperta que a minha. Tive essa certeza quando me caiu a ficha de que ele nunca seria tolo a ponto de perder o traço tão alegre da meia lua desenhada com as pernas no chão molhado para pensar no que aquela moça, que atravessava a rua correndo atrás dos seus minutos, perto do viaduto Pompéia, tinha dentro da sua cabeça “normal”. Não! Definitivamente ele não me parecia tão insano assim.

Tuesday, December 13, 2005

La enfantin liberté


... é QUando a gEnte bRinca de mocinHo e banDiDo e, quaNdo CanSa de ser Um, fiNGe que é O oUTro. LibeRdade é quAndo A genTe sAbe qUe Não é NEnhuM deLes e sAbe quE é SÓ uMa criAnÇa bRinCando. E o MaIs leGal da bRinCadEira é Ser LiVre o baStantE do mEdo de sEr alGuÉm diferente.

Minha primeira vez.

Aqui estou, e comigo estão. Minhas palavras precisam de repouso, é hora de reorganizar minhas gavetas. Cuspidas aqui estão, e comigo estou.